1 de mai. de 2007

Quem nasce Zé...

MÚSICA (30/4/2007)
Quem nasce Zé...

Zé Geraldo nos dois momentos do show ´Um pé no mato, um pé no rock´, registrando seu primeiro DVD (Foto: Maurício Barbieri)

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Décimo quinto álbum, primeiro DVD:
“Um pé no mato, um pé no rock” comprova a integridade da trajetória do mineiro Zé GeraldoO Zé mineiro já é quase um paulistano, embora jamais tenha deixado de lado as suas raízes regionais.
Não só quando faz música. Fez mais: aproximou o desejo de liberdade e de felicidade brejeira das lições de paz e de amor à natureza e à vida, colhidos e difundidos pela geração dos anos 60, através de gurus como Bob Dylan e alguns outros. Como comprova este projeto: nas duas frentes do palco do Sesc Pompéia (claro, em São Paulo), ele divide o show em “Um pé no mato” e “Um pé no rock”.Salvo do conturbado sonho da bola por um acidente de carro, Zé Geraldo, 62, começou como ZeGê, nos anos 70, apostando no universo romântico. Após alguns compactos, um LP e vários festivais, terminou a década como Zé Geraldo, lançando o álbum “Terceiro Mundo”. Nele, seu maior sucesso até hoje, como intérprete: a balada urbana “Cidadão”, música de Lúcio Barbosa: “Tá vendo aquele edifício, moço?/Ajudei a levantar (...) Mas me diz um cidadão/criança de pé no chão/aqui não pode estudar”... Já ouviu?O antigo hino do velho “bicho-grilo” (formado em Administração de Empresas) continua muito popular em todo o país. Dos imediatamente seguintes “Estradas” (1980) e “Zé Geraldo” (1981), seu DVD contempla alguns outros sucessos: a valsa-guarânia “Rio Doce” e a folk das folks “Como diria Dylan” (“Nunca deixe se levar por falsos líderes/Todos eles se intitulam porta-vozes da razão”), do primeiro (nas respectivas metades, “do mato” e “do rock”), e, do outro, “Senhorita” (“Aqui é pequeno/mas dá pra nós dois/E se for preciso/a gente aumenta depois”), “Milho aos pombos” e “Olhos mansos”, as duas últimas, do “rock”, em ambas contando com toda a sede de liberdade deste mineiro do mundo e com sua também dylaniana harmônica, tocada ainda, claro, naquela sua referência direta ao velho ídolo.De “Sol Girassol” (1985), constam: “Semente de tudo” e “A poeira, o canto e você” (canções de amor em clima folk que, como outras de seu repertório, revelam seu lado junkie em versos como “Eu sou o atalho de todas as grandes/estradas por onde passei”) na primeira parte do DVD.
A segunda é aberta por “Peão de trecho”, do também ao vivo “Poeira e Canto” (1988). “Uma parte do mundo é nossa morada/A outra parte é o nosso quintal”... A partir dela, zera tudo: Zé chega de camiseta, o cenário muda e o rock´n´roll rola solto. A faixa também constaria do “Viagens & versos” (1989), onde também aparece “O seringueiro”, homenagem ao líder acreano Chico Mendes, morto um ano antes.Já “Lua curiosa”, baladona brejeira com Tavares Dias e Cacá Bloise, é de “No arco da porta de um dia” (1986). A baladona junkie “Galhos secos” vem de “Ninho de sonhos” (1991). Do álbum “Aprendendo a viver” (1995), vem o rock “Terceiro Mundano” (com Aroldo Santarosa) e “Deságua”, moda de viola que abre o novo projeto. De “No meio da área” (1998), os country-rocks “Zé e José” (em que, contra as “cabeças treinadas para competir”, Zé “cantou histórias das estradas”) e “Uma balada pra Gija”, além da toada “Olhos de jardineiro” (“Esperar é acreditar/A vida me ensinou a esperar”). E tem, de seu CD anterior, outra road-canção “Tô Zerado” (2004), outro rock em que Zé critica “a ilusão do Gugu e do Faustão”, na faixa-título; a toada “Tão bonita” (nos extras) e ainda “A baba do Ali Babá”, veemente parceria com Tavares Dias sobre “esse país de ladrões”.
Toda a discografia consta dos extras do DVD, que também trazem depoimento sobre as principais influências, o sertanejo Tião Carrero e o universal Bob Dylan, além de “Tão bonita” e da inédita, faixa-título de seu próximo CD “Catadô de Bromélias”, mais para o caminho “do mato”) e ainda de um coro de sua “família zegeraldiana”, cantando “Poema e trova”, de seu disco de 1986. O velho Zé de tantas canções e de tantas estradas balançou.


Cidadania junkieEntre bons solos de Zé e de seus músicos, sobretudo em sua segunda parte, “Um pé no mato, um pé no rock” reafirma todos os valores espalhados nas duas frentes musicais levadas por Zé Geraldo ao longo de sua carreira. Baladas junkies guiadas pelo acordeom, pela viola ou pela guitarra, que valem um bocado, mesmo diante da ausência de clássicos como “Uai, Bichinho” e “Voar voar” (do álbum “Caminhos de Minas”, de 1983) e ainda, do disco seguinte, “Quem nasce Zé não morre Johnny não” e a igualmente marcante faixa-título “Sol Girassol”.Em todos estes álbuns, Zé Geraldo gravou principalmente canções próprias, mas aqui e acolá interpretou parceiros de ideais como: “Cachorro Urubu” (Raul Seixas/Paulo Coelho), “Notícias de terra civilizada” (Jorge Mello e Belchior), “Negro amor” (Bob Dylan, em versão de Péricles Cavalcante) e “Aprendendo a viver” e “Demasiadamente urbano”, do velho amigo Renato Teixeira, com quem gravou um outro registro ao vivo, “O Novo Amanhece” (Kuarup), na companhia de sua filha, a cantora Nô Stopa, e do herdeiro de Renato, Chico Teixeira. Renato participa do DVD em “Lua Curiosa”.

Já Nô, divide com o dono da festa o rockão “Terceiro Mundano”. E tem ainda o vocalista da banda capixaba Manimal, Alexandre Lima. Ele canta“Como diria Bob Dylan” e vai de guitarra e sax em outras.“Um pé no mato, um pé no rock” é um prêmio a mais para a carreira deste cantor e compositor que soube manter sua linguagem e sua generosidade, em mais de 30 anos. Segundo lançamento de seu selo, o “Sol do Meio dia”, após “Tô Zerado”, o projeto também chega em CD (o décimo quinto de sua carreira), com cinco faixas a menos: “A poeira, o canto e você”, “Rio doce” e ainda “Tô Zerado”, “A baba do Ali Babá” e “Uma balada pra Gija”.No show, que muda de cenário e de instrumentação após as primeiras nove faixas, Zé Geraldo (voz, violão e gaita) é acompanhado por Jean Trad (violão e guitarra), Carlito Rodrigues (baixo acústico e baixo elétrico), Carneiro Sândalo (bateria e percussão), Aroldo Santarosa (violão, guitarra e vocal), Alexandre Lima (sax, guitarra, violão e vocal), Xuxa Levy (flauta, teclados e vocal), Gabriel Levy (acordeão), Nô Stopa (vocal) e Tuca Fernades (vocal). Uma moçada com quem Zé está sempre na estrada, levando todo o romantismo de um cidadão terceiro-mundano.


HENRIQUE NUNES.

Repórter

Origem dos documentos:

http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=428716

Que beleza estas reportagens: